segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

A tempestade perfeita

(Brasil Agro)

Os atuais cenários econômico e político que estão se formando no país podem ser funestos para a atual administração pública federal. Após enfrentar uma das eleições mais apertadas da história recente de nossa democracia, os problemas que foram “abafados” no período eleitoral começam a se tornar cada vez mais evidentes.


Apesar do fato de que, provavelmente, nunca saberemos as reais dimensões da corrupção envolvendo a Petrobras, várias das principais empreiteiras do país e parte de políticos da base governista, a população percebe que este é um dos maiores escândalos que o país já enfrentou tanto em relação ao número de envolvidos quanto aos valores astronômicos.

Na parte econômica, sem o cenário cor-de-rosa das propagandas eleitorais, a população também está percebendo que o futuro (próximo?) será sombrio, com estagnação econômica, elevada inflação, perda real de poder de compra e elevação do desemprego.

Aliando os dois cenários citados acima, a população está com a impressão de que estão pagando pelos erros de política econômica, enquanto os políticos estão saqueando nossas principais empresas estatais. Isso sem contar a relação custo-benefício do programa “bolsa empresário”, que foi financiado pelo BNDES e apresentou resultados medíocres tanto em termos de desenvolvimento e fortalecimento das empresas nacionais quanto no bem estar da sociedade brasileira.

Os resultados do último pleito indicam que quase a metade do eleitorado já estava insatisfeita com a atual administração pública federal. Com o anúncio de medidas recessivas e impopulares, mas necessárias, que foram demonizadas na disputa eleitoral, a atual administração vem desagradando parte da outra metade do eleitorado sem conquistar àqueles que votaram na oposição.

Temos ainda a possibilidade de racionamento de água em várias regiões do país, especialmente no estado de São Paulo, que atinge a popularidade das administrações públicas municipais e estaduais, mas também federal. Adicionalmente, a crise hídrica, que pode afetar a oferta de energia, também tem grande potencial de afetar negativamente a popularidade da administração pública federal e o desempenho da economia. Finalmente, a perda desastrada da presidência da Câmara dos Deputados e a redução da base governista que é confiável elevam o potencial de instabilidade política.

Boa parte dos problemas enfrentados atualmente é decorrente de erros de política econômica do PT que insistiu em uma série de medidas duvidosas que ficou conhecida como a “Nova Matriz Econômica”. Esta prometia uma revolução positiva nas condições econômicas e sociais brasileiras, mas entregou justamente o oposto.

Certamente os efeitos do cenário internacional não são insignificantes, mas é difícil argumentar que é a principal causa quando o pior já parece ter passado, enquanto o país está mergulhando, cada vez mais, em um período de recessão, que trará custos sociais importantes, sobretudo na parcela da população que elegeu a atual administração para mais quatro anos. 

domingo, 15 de fevereiro de 2015

Dormindo no serviço


Em recente pesquisa realizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), constatou-se que a intenção de investimento dos empresários industriais, no ano corrente, é a menor desde 2010. Mesmo em relação a 2014, que foi um ano bem difícil para a indústria brasileira, ocorreu uma significativa queda nas intenções de investimento: de 78,1% dos empresários industriais em 2014 para 69,3% em 2015.

De acordo com os empresários entrevistados, o principal motivo para a baixa intenção de investimento é a incerteza econômica (77,4%), seguida por reavaliações da demanda (45%) e custo do crédito (34,2%). Podemos dizer que, atualmente, os erros de política econômica estão entre as principais causas dos três fatores mais relevantes para a baixa intenção de investimentos apontados pelos empresários industriais entrevistados.

As medidas de política econômica adotadas a partir do segundo mandato de Lula e intensificadas no primeiro mandato de Dilma, conhecidas como “Nova Matriz Econômica” – ou seja, estímulos fiscais setoriais, elevação do volume de crédito via bancos públicos, redução da taxa de juros de forma forçada e controle da taxa de câmbio para mantê-la competitiva –, resultaram em estagnação econômica, além da elevação da inflação, do déficit interno, que impacta a dívida do governo, e do déficit externo, com efeitos sobre a dívida externa.

Em outras palavras, a “Nova Matriz Econômica” e as tentativas de encobrir os problemas que começavam a aparecer, como o controle de preços administrados e a contabilidade criativa adotada pelo governo federal, são as principais responsáveis pela deterioração nos fundamentos da economia que levaram a um maior nível de instabilidade macroeconômica, com efeitos sobre a demanda agregada da economia e também do aumento do custo de crédito.

A nova equipe econômica denominada “liberal” foi composta para tentar arrumar a casa e colocar novamente a economia em uma rota de crescimento positivo de forma sustentável. O problema é que o trabalho é muito maior do que consertar as consequências de uma aventura irresponsável na condução da economia. Enquanto a equipe econômica anterior fazia suas experiências, o governo esqueceu que, para a manutenção do crescimento de longo prazo, reformas e investimentos são cruciais, e essa conta também está chegando para pagarmos.

Outra pesquisa da CNI sobre a competitividade internacional mostra que, entre os 14 principais concorrentes do Brasil, só não perdemos para a Argentina, sendo que o nosso país perdeu posições nos quesitos ambiente macroeconômico e infraestrutura/logística. Dessa forma, nesses últimos dois mandatos não foi comprometida somente a capacidade de crescimento no curto prazo, mas os efeitos também serão sentidos no médio e longo prazos.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Petróleo em queda? Novamente a oferta e a demanda

(Gazeta do Povo - 28/12/2014)

A atual queda do preço do barril de petróleo, que ficou aquém da barreira dos US$ 60, sem corte da produção por parte dos países membros do cartel da Organização de Países Exportadores de Petróleo (Opep), parece uma contradição. Recentemente, o ministro de energia dos Emirados Árabes Unidos (EAU), Suhail Al-Mazrouei, relatou à Bloomberg que a Opep não irá reduzir a oferta do produto mesmo que os preços fiquem abaixo de US$ 40 por barril

A referida organização fornece cerca de 40% do petróleo mundial e tem 85% das reservas, ou seja, possui grande poder na formação dos preços através do controle na quantidade ofertada, e poderia realizar cortes na produção para elevação dos preços se assim desejasse. Então, quais as causas que levaram às declarações do ministro árabe?

Em primeiro lugar, é preciso lembrar que existem fontes alternativas de energia e, no conjunto, a sua oferta tem se elevado mais do que aquela do petróleo nas últimas décadas. Em segundo lugar, a crise internacional – que se iniciou em 2007 e ainda afeta duramente a Europa, além de começar a mostrar sinais mais claros no desempenho da economia chinesa – reduziu o crescimento previsto da demanda mundial por energia. Outro ponto importante é que a produção de petróleo e gás de xisto tem tornado os Estados Unidos cada vez menos dependentes das importações de petróleo. Finalmente, o preço do petróleo estava elevado, quando comparado com a média de décadas anteriores, mesmo descontando a inflação do período, estimulando o aumento da oferta de petróleo e de fontes alternativas de energia. Todos esses fatores levaram a um excesso de oferta, com consequente redução do preço do produto.

Um preço elevado do petróleo quase não tem efeitos sobre a demanda, no curto e médio prazo. No entanto, no longo prazo existe uma considerável substituição por fontes alternativas. Em economia, dizemos que a elasticidade-preço da demanda é pequena no curto prazo, mas elevada no longo prazo. Por exemplo, quem não se lembra do Proálcool, incentivado pelos choques do petróleo nos anos 70? O elevado preço do petróleo estimulou o governo militar brasileiro a procurar fontes alternativas que demandaram investimentos em pesquisa, inovações e investimentos na produção do etanol. Tudo isso leva um tempo considerável para ser realizado e, desse modo, o impacto sobre a demanda do petróleo, via substituição por fontes alternativas, acontece somente ao longo do tempo.

Atualmente, a Opep parece estar agindo de forma oposta para equilibrar a oferta e demanda, mas, sobretudo, com foco no longo prazo. Um preço mais baixo do petróleo irá desestimular novos investimentos na ampliação de sua produção futura e também em fontes alternativas, além de tirar do mercado os produtores com custos mais elevados, reduzindo a sua oferta futura e, portanto, elevando os preços ao longo do tempo. Em outras palavras, o que pode parecer um paradoxo do ponto de vista da decisão do cartel da Opep nada mais é do que uma decisão racional tomada na tentativa de maximizar o seu lucro intertemporalmente.