quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Em busca da felicidade


Nós, economistas, somos obcecados por desvendar os fatores fundamentais na determinação do crescimento e desenvolvimento econômico. A razão para isso é que esse campo de pesquisa analisa o comportamento do ser humano enquanto indivíduo que se relaciona no mercado, ou seja, considerando todas as outras variáveis constantes, maior renda gera mais consumo, que, por sua vez, reflete-se em níveis mais elevados de satisfação e felicidade.

Essa relação entre renda, consumo e satisfação apontada pelos economistas não é tão restrita quanto possa parecer à primeira vista. As pessoas, em grande parte do mundo, inclusive no Brasil, têm uma grande demanda reprimida por moradia, vestimentas e alimentação, entre outros elementos básicos necessários à sobrevivência. Nessas regiões, uma pequena elevação da renda e do consumo tem um grande potencial em aliviar suas vidas sofridas.

Adicionalmente, a definição da palavra “consumo” é bem ampla. Por exemplo, a demanda por serviços de saúde que melhoram a vida da população de diversas maneiras é uma das que mais aumentam atualmente, sendo possível graças à elevação da renda per capita, pois o preço dessa categoria de serviços é bem elevado. Que cidadão não gostaria de chegar à terceira idade com saúde para aproveitar bem a aposentadoria?

O consumo também vem na forma de mais segurança, não apenas de forma privada, ao contratar seguranças, instalar portões eletrônicos e cercas elétricas, mas sobretudo sob a forma de gastos em melhorias dos sistemas judiciário e de segurança pública. Em países onde esses sistemas têm um bom funcionamento, não é necessária a realização de gastos privados substanciais em segurança como na instalação de portões, grades e, muito menos, cercas elétricas e vigias.

Podemos pensar também na educação. Mesmo sendo um tipo de investimento (assim como gastos em saúde), pois eleva a produtividade do trabalho, a educação também é uma forma de consumo. Não colocamos nossos filhos na escola pensando somente em seus retornos salariais futuros. Uma boa formação traz uma satisfação pessoal que vai muito além dos rendimentos, inclusive com potencial de redução da criminalidade quando existe um bom sistema educacional em nível nacional.

Poderíamos nos estender nos tipos de consumo que são decorrentes da elevação da renda e que levam a melhorias no nível de bem-estar social. No entanto, os exemplos citados são suficientes para entender o excesso de foco sobre os determinantes da renda (que gera consumo) por parte dos economistas.

O problema é que existem outros fatores tão importantes quanto a renda na determinação do nível de bem-estar social, mas que são praticamente desconsiderados nas análises econômicas, como aqueles ressaltados no relatório de felicidade global divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU). Alguns elementos considerados no relatório, além da renda per capita e saúde, são índices que tentam mensurar companheirismo (ter alguém em quem confiar), liberdade de escolhas, corrupção e generosidade. Poderíamos pensar também em fé em Deus e em vida após a morte, aceitação em relação às diferenças individuais e sociais, círculos de amizade, sustentabilidade ambiental, nível de estresse no trabalho, família e lazer, para citar alguns elementos importantes.

Portanto, os economistas, em suas análises voltadas para o nível de bem-estar social, precisam se concentrar mais em outros elementos importantes na sua determinação, visto que um dos nossos principais objetivos é justamente entender as determinantes do nível de bem-estar social, do qual a renda (que gera consumo) é somente um deles.

domingo, 29 de setembro de 2013

Esse cara flutua



  Gosto de olhar as pessoas e ver o potencial que elas têm em realizar as coisas. Esse vídeo parece não ter nada a ver com o tema economia e desenvolvimento, mas, em última instância, tudo parte das pessoas, sejam as decisões de investimento, da formação das instituições, do esforço no trabalho, etc. Quando o indivíduo possui uma meta, faz o planejamento, coloca energia em sua realização, as coisas acontecem, como pode ser visto no vídeo. Quando uma nação traça uma meta voltada para o desenvolvimento econômico e social, faz um planejamento adequado, cuidadoso e diligente e coloca energia nesse projeto, o resultado é que as coisas acontecem.



terça-feira, 17 de setembro de 2013

Entrevista com Edmund Phelps

  O prêmio Nobel em economia Edmund Phelps deu um entrevista para a Revista Exame (clique aqui) falando sobre a importância da inovação sobre o crescimento de longo prazo, o que não é nenhuma novidade.

  No entanto, ele coloca algumas coisas bem interessantes que não são convencionais no pensamento dominante em economia. Um exemplo é como a lei de patentes foi longe demais, em alguns casos. Para ele, para dinamizar a economia americana, todas as patentes deveriam ser extintas, recomeçando tudo do zero, ou seja, novas patentes seriam concedidas somente para inovações feitas a partir do período atual.

  Outro ponto relevante que ele coloca, e que em muitos modelos econômicos o mecanismo é mais restrito, é que as inovações dependem não somente das pessoas engajadas em processos de P&D, mas também das pessoas que estão ligadas diretamente ao processo produtivo. Paul Romer também enfatiza esse ponto em um artigo de 1993. Vale a pena ler a entrevista!

terça-feira, 2 de julho de 2013

Manifestações e governo no Brasil

(Gazeta do Povo - 02/07/2013)

As recentes manifestações que ocorreram no país mostram certa insatisfação da população brasileira com nossos governantes. Pela primeira vez desde a eleição do governo Dilma, a oposição sente que tem chances de vencer o governo atual nas eleições de 2014, mesmo considerando que as manifestações vão muito além de uma disputa entre situação e oposição.

O povo brasileiro está cansado de tanta corrupção, desigualdade de renda, serviços públicos precários, sensação de insegurança nas ruas, elevada carga tributária, ineficiência nos gastos públicos e elevação da inflação, além do estilo autoritário e inflexível da presidente. O estranho é pensar sobre as razões que levaram a população às ruas no momento atual, em que a economia apresentou uma significativa evolução em relação aos anos 80 e 90, além de presenciar sensível melhora na renda média e na sua distribuição, nos anos 2000.

A minha impressão é de que, depois de sentir a possibilidade de que o país entraria em uma rota segura de crescimento da renda e de desenvolvimento econômico (semelhante à sensação que a população brasileira presenciou nos anos 70), o enfraquecimento econômico e os sinais cada vez mais claros de que ele é resultante de problemas internos deixaram a população transtornada. Mais uma vez, somos apenas o país do futuro.

A contradição nas manifestações é que sempre existe uma demanda que pressiona os gastos públicos como, por exemplo, redução das tarifas e melhora dos sistemas de educação e saúde, além da segurança. No entanto, quase todas as sugestões de especialistas para que se possa colocar a economia novamente em uma rota de crescimento passam por reduções dos gastos do governo.

O governo precisa reduzir os seus gastos como proporção do PIB para: conter a inflação e reverter o novo ciclo de elevação dos juros, o que é essencial para estimular os investimentos; reduzir a dívida pública, o que também favorece os investimentos ao fortalecer os fundamentos econômicos; reduzir a carga tributária, favorecendo a poupança e investimento privados; elevar a poupança do governo, reativando a capacidade de investimentos em infraestrutura, educação e saúde; fazer frente às demandas futuras de elevação dos gastos previdenciários.

Desse modo, é preciso entender que o governo no Brasil já é muito grande e maiores demandas irão redundar em instabilidade econômica e redução do crescimento devido à elevação da dívida pública e da carga tributária futura, além de estimular a inflação pelo aumento da demanda e da pressão em se emitir moeda para fechar as contas públicas. Uma carga tributária mais elevada, com o excesso de burocracia existente, irá sufocar ainda mais o setor privado, gerar novas oportunidades de corrupção e reduzir a capacidade de crescimento no futuro.

Os jovens que estão saindo às ruas precisam se perguntar o que eles podem fazer por essa nação e não somente o que o país pode fazer por eles. Um dos pontos mais importantes para se focar é na educação, trabalho com determinação, além da busca de informações sobre as medidas necessárias para que o país possa encontrar uma rota de crescimento sustentável, com distribuição de renda e respeito aos menos favorecidos e ao meio ambiente.

quinta-feira, 13 de junho de 2013

Automóveis e instituições

(Diário da Manhã - 12/06/2013)


Um dos fatores cruciais na determinação do desenvolvimento de uma economia é qualidade de suas instituições. O arcabouço institucional fornece os mecanismos de incentivos aos agentes econômicos como, por exemplo, a garantia do direito de propriedade que estimula os investimentos produtivos ao propiciar ao indivíduo o retorno de seus investimentos e trabalho.

Um bom exemplo do papel das instituições pode ser encontrado no setor automobilístico. Em uma recente reportagem da agência Associated Press, republicada por vários veículos de comunicação como o The New York Times e Washington Post, pode-se notar que o diferencial de segurança é extraordinário em modelos similares vendidos no Brasil, Estados Unidos e Europa. A menor segurança dos modelos similares vendidos no Brasil também pode ser verificada pelos testes realizados pela Latin NCAP e Euro NCAP, institutos independentes que realizam testes de segurança dos veículos vendidos na América Latina e Europa, respectivamente. Nos testes, por exemplo, a versão do Nissan March produzido no mesmo país, México, e vendido para o Brasil obteve duas estrelas, enquanto que aquela destinada à Europa obteve quatro estrelas, em um máximo de cinco.

Considerando que são as mesmas empresas que produzem e vendem os veículos nas diferentes regiões, é razoável supor que a tecnologia disponível para o processo produtivo é a mesma, ou seja, a qualidade do produto poderia ser a idêntica independentemente onde o veículo é produzido. Então porque a qualidade - em termos de segurança, pelo menos - não é a mesma? A resposta é clara: a qualidade institucional varia nas regiões, sendo que ela é pior no caso brasileiro.

Na reportagem, um engenheiro da indústria automotiva, que não quis se identificar, menciona que em uma versão existe um reforço na estrutura do veículo, enquanto que na outra não. De qualquer forma, os carros que são produzidos e vendidos em nosso mercado estão de acordo com as normas brasileiras de segurança. Desse modo, as empresas do setor do setor automobilístico só estão respondendo aos mecanismos de incentivos diferentes.

Se as leis fossem mais rígidas no quesito segurança, os carros vendidos no mercado brasileiro seriam mais seguros com pouco efeito sobre os custos e preço de venda. Essa é uma questão que o mercado não consegue resolver muito bem, pois as empresas usam os itens de segurança para discriminar preço, ou seja, cobrar mais caro das pessoas que estão dispostas a pagar por um produto com pequenas alterações. Um bom exemplo é que o custo do airbag duplo instalado fica em torno R$ 140,00 para o fabricante, enquanto que o preço cobrado ao consumidor ficava entre R$ 1.000,00 e R$ 2.000,00, poucos anos atrás. Outro ponto importante é que as pessoas não avaliam muito bem os riscos de um acidente de carro, ou seja, acham que a probabilidade de ocorrência é menor do que realmente é.

Com carros menos seguros, os custos sociais e mesmo estritamente econômicos acabam sendo mais altos. Acidentes deixam pessoas incapacitadas, pressionando a previdência, aumentam os custos nos hospitais pelo maior número de feridos e com maior gravidade nos acidentes, além de retirar a vida de muitas pessoas, com um custo que é difícil de ser mensurado. Ponderando pelo preço que se paga por um automóvel no Brasil, o mínimo que se poderia esperar é um produto de qualidade. Como uma boa parcela do preço é decorrente dos impostos, o governo deveria dar um retorno mais adequado no sentido de fornecer uma legislação mais rígida.

O que esse exemplo ressalta é que a baixa qualidade das instituições faz com que todos percam, pois os custos adicionais para melhorar a segurança são consideravelmente menores do que os custos associados a veículos com reduzida segurança. Analisando que a qualidade das instituições afetam todos os setores produtivos da economia, dá para imaginar que seus efeitos sobre o nível de desenvolvimento de um país são consideráveis.