segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Melhorando a qualidade do sistema educacional

(Diário da Manhã - 25/12/13)

Temos presenciado, recentemente, um debate sobre a quantidade de recursos destinados ao sistema educacional brasileiro. A meta traçada foi a de alcançar um nível de gastos equivalentes a 10% do PIB na educação. Os resultados do PISA, exame promovido pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) para avaliar o desempenho dos alunos de 15 anos em matemática, ciências e leitura, mostram que aperfeiçoar o nosso sistema educacional é, de fato, essencial, visto o nosso fraco desempenho: dos 65 países avaliados, ficamos na 58a posição, abaixo de países latino-americanos como Chile, México, Uruguai e Costa Rica.

A melhora do nível educacional é fundamental para que o país acelere sua taxa de crescimento, pois pessoas mais capacitadas exercem suas atividades laborais de maneira mais eficiente, promovem a adoção e inovação de produtos e processos de produção, permitem o surgimento de segmentos industriais e do setor de serviços mais dinâmicos tecnologicamente, além de serem mais conscientes politicamente, o que é decisivo para colocar governantes mais preparados no poder e, desse modo, aprimorar as políticas econômicas e sociais. Adicionalmente, avançar na qualidade dos diferentes níveis educacionais é o principal fator para gerar novas oportunidades de trabalho da população menos favorecida e, assim, reduzir a má distribuição de renda.

No entanto, o debate sobre a proporção dos gastos no PIB destinados ao setor educacional ocorreu de forma muito superficial, pois a quantidade de gastos não reflete, necessariamente, melhoras no mesmo. Adicionalmente, é preciso pensar na origem dos recursos, pois dependendo de onde eles serão retirados, o saldo de tais políticas pode ser o oposto do esperado.

Antes de qualquer coisa, o debate deveria ter focado nas medidas necessárias para aperfeiçoar o sistema educacional. Para atingir esse objetivo, é preciso pensar em como atrair bons professores para os níveis de ensino público pré-escolar, fundamental e médio, ou seja, focalizar na melhora das condições de trabalho e de salário em relação às atividades que exigem o mesmo nível de titulação, ou seja, é crucial valorizar o profissional da educação. Não é possível formar bons alunos sem a presença de um corpo docente com boa qualificação e motivado. Adicionalmente, é preciso elaborar mecanismos de incentivo que estimulem o esforço dos profissionais da educação, sejam os professores ou os responsáveis pela administração das escolas, como um plano de cargos e salários compatíveis com a formação e desempenho de cada profissional, prêmios por desempenho para os profissionais da educação e escola, entre outros. A associação entre total isonomia salarial e estabilidade no emprego é o principal motivo que reduz a eficiência dos servidores desse sistema.

Também é preciso dar todo o suporte para que os alunos sejam estimulados a estudar sem criar pressões para aumentar a taxa de evasão. Aulas de reforço e acompanhamento psicológico para alunos com dificuldade e provenientes de famílias desestruturadas, além da elevação da carga horária são elementos importantes nessa discussão. Em suma, é preciso adotar medidas que atraiam bons profissionais e que estimulem o bom desempenho daqueles que já estão e estarão empregados no sistema educacional, sem esquecer que tais incentivos precisam ser adotados por um longo período de tempo antes que avaliações decisivas dos seus resultados possam ser realizadas.

domingo, 15 de dezembro de 2013

Cavando a própria cova

(Folha Online - 11/12/13)

Atualmente, é difícil negar que os problemas econômicos enfrentados pelo país são, em grande medida, consequências das decisões tomadas pela sua equipe econômica. Nos anos do governo Dilma, o crescimento da economia brasileira tem ficado sistematicamente abaixo dos demais países da América Latina. Para 2013, de acordo com as estimativas da Comissão Econômica da ONU para a América Latina e Caribe (CEPAL), o Paraguai apresentaria a maior taxa de crescimento com um aumento do PIB em 12,5%, seguido por Panamá (7,5%), Peru (5,9%), Bolívia (5,5%), Nicarágua (5,0%) e o Chile (4,6%). A Argentina cresceria 3,5%, o México 2,8% e o Brasil 2,5%. A média para os países da América do Sul seria de 3,1%.

A estratégia de estimular a demanda, mesmo após certa estabilização do cenário internacional, mostrou-se ser um grande erro de diagnóstico. Apesar do baixo crescimento da economia brasileira nos anos Dilma, o desemprego tem permanecido em patamares muito baixos. Desse modo, estímulos à demanda têm pressionado os preços e as importações, deteriorando tanto as contas públicas quanto as contas externas brasileiras. Para controlar as pressões inflacionárias, o Banco Central se viu obrigado a entrar, novamente, em um ciclo de elevação das taxas de juros, o que provoca pressões adicionais nas contas públicas.

Em outras palavras, o erro de diagnóstico gerou mais problemas que vêm aumentando a fragilidade macroeconômica do país, além da elevação dos juros, tendo como consequência a redução do nível de investimentos, o que ajuda a manter a taxa de crescimento do PIB em níveis módicos. Adicionalmente, os estímulos à demanda provocaram uma elevação dos salários e dos preços no setor de serviços, de uma forma geral, provocando pressões salariais na indústria e, portanto, perda de competitividade, o que prejudica o desempenho da economia visto a importância desse setor em termos de dinamismo e produtividade.

Para controlar a inflação, além dos juros, a equipe econômica tem adotado várias medidas não convencionais, como controle dos preços administrados, redução da tarifa de energia, controle do preço dos combustíveis, entre outros, o que gera incerteza do ponto de vista institucional, piora o balanço de empresas e, desse modo, restringe a quantidade de investimento e a capacidade de oferta no médio prazo. 

O baixo crescimento da economia brasileira é decorrente de fatores de oferta e não de demanda. Os problemas de infraestrutura, baixos investimentos, escolaridade deficiente dos trabalhadores e produtividade estagnada explicam o fraco desempenho econômico brasileiro, além da piora nas contas públicas que decorrem também do aumento automático dos gastos como proporção do PIB devido às pressões do sistema previdenciário. 

Os gestores de política econômica precisam focar nos problemas de oferta apontados acima para que o país possa entrar em uma trajetória de crescimento sustentável. No entanto, pela teimosia na manutenção das mesmas políticas econômicas e pelo fato de estarmos entrando em um ano eleitoral, a tendência é que os fundamentos do país piorem ainda mais, e que, a partir de 2015, o crescimento econômico que já é pífio se torne ainda pior.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

O governo Dilma e a privatização

(Gazeta do Povo - 04/12/13)

Presenciamos, há poucas semanas, a terceira rodada de concessões de aeroportos brasileiros. Ela garantiu uma arrecadação total de R$ 20,8 bilhões para o governo federal. Enquanto o aeroporto do Galeão (Rio de Janeiro) foi arrematado por R$ 19 bilhões, o de Confins (Belo Horizonte) foi arrematado por R$ 1,82 bilhão. Esses recursos não significam entrada líquida para o governo federal, pois, como enfatizado por Mansueto Almeida, economista e técnico do Ipea, o valor total arrecadado ingressará nos cofres públicos ao longo de mais de duas décadas (25 para o Galeão e 30 anos para Confins). Em segundo lugar, como a Infraero será sócia do consórcio vencedor com 49% de participação, ela precisará arcar com parcela dos investimentos com aporte de recursos do governo federal. Em terceiro lugar, a receita adquirida com as concessões será anulada com programas novos do governo de custo elevado que não existiam antes.

De qualquer forma, podemos considerar que essa terceira rodada foi um sucesso pela atração de grupos concorrentes e consequente ágio de quase 300% em relação ao preço mínimo do leilão. Mais ainda, reflete o pragmatismo tardio do governo federal em reconhecer a importância do setor privado na realização de investimentos em infraestrutura e na elaboração de regras de concessão que também sejam favoráveis ao investidor. Não há como querer atrair o capital privado quando existem alternativas mais atraentes que os leilões realizados pelo governo federal.

A participação do capital privado na realização de investimentos em infraestrutura é crucial, dada a reduzida capacidade de investimentos nas diferentes esferas de governo, além da já elevada carga tributária. Elevações adicionais da carga tributária para incrementar o investimento público em infraestrutura devem ser mais que compensadas pela redução do investimento privado total, pois mais impostos sufocam a já difícil situação do empresariado brasileiro.

Para amenizar e transpor os gargalos existentes na infraestrutura de energia e transportes, o governo federal terá de aprofundar essa trajetória de privatizações e criar as condições necessárias para a atração de capital privado nacional e estrangeiro. Já passou o momento de deixar ideologias ultrapassadas para trás e de reconhecer a importância dos investidores privados na manutenção e elevação dos investimentos necessários para o crescimento da economia brasileira.

No entanto, o governo ainda precisa perceber a importância da estabilidade das regras, da transparência e do funcionamento dos mercados para a atração do capital privado em maior escala para alavancar os investimentos, sobretudo do capital externo, pela falta de poupança pública. Não adianta apenas perceber o papel crucial do investimento privado no processo de crescimento se há interferências constantes do governo no mercado para controlar a inflação de forma heterodoxa, se há falta de transparência nas regras e na disponibilidade de informações básicas como, por exemplo, o superávit primário, além de quebras de contrato. O governo federal precisa ser um bom juiz e confiar nos jogadores para que eles possam exercer seus respectivos papéis.

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Investimento em capital humano

(Gazeta do Povo - 14/11/13)

A história brasileira destaca que, no século passado, a grande estratégia de crescimento foi baseada no crescimento do estoque de capital físico via industrialização por substituição de importações. Em alguns períodos, tal estratégia se mostrou bem-sucedida, sobretudo no fim dos anos 60 e durante os 70, quando a economia alcançou taxas de crescimento semelhantes às atuais chinesas.

No entanto, ocorreu uma grande negligência no investimento em capital humano devido, parcialmente, a uma falta de conhecimento da importância desse fator no crescimento e desenvolvimento econômico por parte dos principais gestores de política econômica e dos políticos naquele período. As teorias do capital humano começaram a ser desenvolvidas no fim dos anos 50 e início dos 60 em universidades norte-americanas proeminentes como, por exemplo, a Universidade de Chicago. No entanto, grandes pensadores econômicos já tinham mencionado a importância desse fator em períodos anteriores, como Adam Smith.

A noção de que uma estratégia de industrialização via substituição de importações seria o suficiente para levar o Brasil ao nível dos países desenvolvidos se mostrou incorreta. Em estágios anteriores, quando ocorreu a industrialização de países que já eram desenvolvidos em 1950, como Estados Unidos e Inglaterra, o papel do capital humano não era tão relevante porque a maior parte das atividades laborais e gerenciais não exigia grande nível de escolaridade formal. No entanto, quando o país adotou sua estratégia de crescimento, o capital humano tinha um papel mais relevante pela maior complexidade dos processos produtivos do período, pelo maior grau de fluxos de informação existente e pelas mudanças econômicas e tecnológicas que aconteciam de forma mais acelerada.

O capital humano já era um fator mais importante e complementar ao capital físico. Se tivessem ocorrido maiores investimentos no primeiro, a consequência seria um maior retorno do investimento no segundo, levando a um crescimento relevante no estoque de capital físico. Em outras palavras, mesmo para elevar esse fator de produção, o mais importante teria sido realizar investimentos em capital humano.

Atualmente, existe no Brasil uma maior consciência da importância desse fator de produção no processo de crescimento e desenvolvimento econômico por parte dos gestores de políticas econômicas, dos políticos e da população em geral. No entanto, uma das falhas está em obter um diagnóstico bem elaborado sobre os principais determinantes da qualidade do sistema educacional. Existem vários analistas e pesquisadores nacionais e estrangeiros que estão analisando esse tema e estudos financiados por parte do governo ajudariam a entender melhor essa questão em nossa realidade.

Isso vem sendo feito a passos muito lentos quando comparado a medidas e discussões de elevação dos gastos do governo em educação como proporção do PIB sem ter uma boa noção de onde e como esses recursos podem ser aplicados. O que parece é que estamos colocando novamente o carro na frente dos bois por um pensamento de curto prazo, característico da sociedade brasileira, que se reflete em uma falta de planejamento estratégico. Não adianta apenas elevar os gastos em educação; é preciso, sobretudo, de planejamento e estratégias de longo prazo para alavancar o crescimento econômico e gerar um maior grau de desenvolvimento.

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Em busca da felicidade


Nós, economistas, somos obcecados por desvendar os fatores fundamentais na determinação do crescimento e desenvolvimento econômico. A razão para isso é que esse campo de pesquisa analisa o comportamento do ser humano enquanto indivíduo que se relaciona no mercado, ou seja, considerando todas as outras variáveis constantes, maior renda gera mais consumo, que, por sua vez, reflete-se em níveis mais elevados de satisfação e felicidade.

Essa relação entre renda, consumo e satisfação apontada pelos economistas não é tão restrita quanto possa parecer à primeira vista. As pessoas, em grande parte do mundo, inclusive no Brasil, têm uma grande demanda reprimida por moradia, vestimentas e alimentação, entre outros elementos básicos necessários à sobrevivência. Nessas regiões, uma pequena elevação da renda e do consumo tem um grande potencial em aliviar suas vidas sofridas.

Adicionalmente, a definição da palavra “consumo” é bem ampla. Por exemplo, a demanda por serviços de saúde que melhoram a vida da população de diversas maneiras é uma das que mais aumentam atualmente, sendo possível graças à elevação da renda per capita, pois o preço dessa categoria de serviços é bem elevado. Que cidadão não gostaria de chegar à terceira idade com saúde para aproveitar bem a aposentadoria?

O consumo também vem na forma de mais segurança, não apenas de forma privada, ao contratar seguranças, instalar portões eletrônicos e cercas elétricas, mas sobretudo sob a forma de gastos em melhorias dos sistemas judiciário e de segurança pública. Em países onde esses sistemas têm um bom funcionamento, não é necessária a realização de gastos privados substanciais em segurança como na instalação de portões, grades e, muito menos, cercas elétricas e vigias.

Podemos pensar também na educação. Mesmo sendo um tipo de investimento (assim como gastos em saúde), pois eleva a produtividade do trabalho, a educação também é uma forma de consumo. Não colocamos nossos filhos na escola pensando somente em seus retornos salariais futuros. Uma boa formação traz uma satisfação pessoal que vai muito além dos rendimentos, inclusive com potencial de redução da criminalidade quando existe um bom sistema educacional em nível nacional.

Poderíamos nos estender nos tipos de consumo que são decorrentes da elevação da renda e que levam a melhorias no nível de bem-estar social. No entanto, os exemplos citados são suficientes para entender o excesso de foco sobre os determinantes da renda (que gera consumo) por parte dos economistas.

O problema é que existem outros fatores tão importantes quanto a renda na determinação do nível de bem-estar social, mas que são praticamente desconsiderados nas análises econômicas, como aqueles ressaltados no relatório de felicidade global divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU). Alguns elementos considerados no relatório, além da renda per capita e saúde, são índices que tentam mensurar companheirismo (ter alguém em quem confiar), liberdade de escolhas, corrupção e generosidade. Poderíamos pensar também em fé em Deus e em vida após a morte, aceitação em relação às diferenças individuais e sociais, círculos de amizade, sustentabilidade ambiental, nível de estresse no trabalho, família e lazer, para citar alguns elementos importantes.

Portanto, os economistas, em suas análises voltadas para o nível de bem-estar social, precisam se concentrar mais em outros elementos importantes na sua determinação, visto que um dos nossos principais objetivos é justamente entender as determinantes do nível de bem-estar social, do qual a renda (que gera consumo) é somente um deles.